Aprovar estudantes que não cumpriram o desempenho escolar mínimo a toque de caixa. Essa é a realidade que encontramos hoje na escola pública brasileira, em que estudantes conseguem a progressão escolar (o popular "passar de ano") sem alcançar as condições mínimas para ser aprovado nas diversas componentes curriculares.
O termo "aprovômetro" diz respeito justamente a essa atitude da escola em aprovar massivamente estudantes que não cumprem o mínimo de desempenho para progredir de série. E, antes que me julguem, não estou defendendo uma perspectiva conteudista e quantativista de educação, onde o estudante realiza provas e obtém notas para "passar de ano". O problema é muito maior: estudantes que não demonstram interesse ou se quer realizam as atividades cotidianas durante o ano letivo.
Obviamente que a falta de interesse não é responsabilidade apenas do estudante, mas também da escola, da família e da sociedade. A cultura do "achar tudo difícil" está enraizada na sociedade atual, e a escola reproduz essa lógica no dia a dia.
No entanto, o problema que se coloca atualmente é: estamos criando uma lógica de aprovação em massa sem que os e as estudantes adquiram os conhecimentos mínimos para progressão escolar. A quem interessa essa lógica?
Em primeiro momento os próprios estudantes podem concordar com essa lógica e defender sua continuidade. Porém, o que vai acontecer quando esses mesmos estudantes se depararem com exames que cobrarão os conhecimentos que eles não adquiriram na escola por causa da cultura do aprovômetro? Certamente estes estudantes não serão capazes de prosseguir para outras etapas da vida, a exemplo da universidade e dos concursos públicos.
Do meu ponto de vista, essa lógica interessa mais às gestões municipais e estaduais da educação, que olham para a escola e enxergam apenas potenciais resultados nos índices de avaliação, ou seja, enxergam esses e essas estudantes apenas como números.
Para essas gestões os e as estudantes só possuem valor no tocante à possibilidade de elevar os índices de avaliação educacionais, sobretudo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). A partir da instauração dessa lógica cria-se um efeito cascata na hierarquia de gestão: o prefeito/prefeita pressiona o secretário/secretária de educação, que pressiona o coordenador/coordenadora de área da secretaria, que pressiona os gestores/gestoras escolares, que pressiona a coordenação escolar, que, por fim, pressiona os professores e professoras a perpetuar a cultura do aprovômetro.
E na ponta desse sistema hierárquico estão os maiores prejudicados: os estudantes. É o corpo estudantil que irá colher os frutos da cultura do aprovômetro, pois finalizou o ciclo escolar da educação básica sem adquirir os conhecimentos mínimos, não apenas para adentrar à universidade, mas para exercer plenamente sua cidadania.
Diante disso, qual o futuro da cultura do aprovômetro na educação? Sem dúvidas, será um futuro onde os e as esutantes da escola pública, da classe trabalhadora, não poderão ocupar espaços que historicamente lhes foram negados e terão que conviver com empregos mal remunerados para perpetuar o status quo de desigualdade social que vivemos no Brasil.
Precisamos, por fim, superar a cultura do aprovômetro e desenvolver práticas pedagógicas e políticas educacionais que compreendam o e a estudante da atualidade. Além disso, é fundamental acolher essas pessoas e considera-las verdadeiramente como seres humanos em suas diversas dimensões, não nos preocupando apenas se irão ser aprovadas em nossas provas, mas se estão conseguindo desenvolver suas potencialidades e capacidades.
Quando comecei oficialmente como professor de Geografia (assumindo turmas do Ensino Médio) preparava as aulas predominantemente com o uso de slides no Power Point. Os slides são recursos importantíssimos para contribuir com o processo de ensino-aprendizagem, pois possibilita projetar imagens que normalmente não estariam disponíveis para os estudantes.
Acontece que ao longo das aulas que ministrava algo sempre me incomodava: boa parte das turmas não faziam anotações durante as aulas. Acredito que fazer anotações é importante para estudar os conteúdos trabalhados e depois revisa-los no livro didático. Dessa forma, perceber que apenas a menor parte da turma estava anotando os conteúdos me deixava inquieto. Sempre usava o quadro, porém com a finalidade de desenhar esquemas e representações do espaço geográfico.
Até que um dia me veio a ideia de escrever no quadro os conceitos e tópicos que estavam nos slides. Parece uma coisa tão óbvia, tão simples! Porém, foi a partir daí que pude notar que mais estudantes começaram a fazer anotações daquilo que estava abordando nas aulas. Parece mesmo que o ser humano executa determinadas ações através da imitação de outro ser humano.
A partir daí a ficha caiu por uma atração gravitacional tremenda. Desde então venho preferindo escrever conceitos e tópicos no quadro e deixo nos slides imagens, fotos, mapas, gráficos e tabelas para ajudar a ilustrar melhor os conteúdos que estão sendo abordados. Sei que para muitas pessoas isso é uma coisa bastante óbvia, mas para quem está iniciando sua trajetória na docência essas situações não são tão nítidas.
Portanto, decidi escrever sobre essa experiência para auxiliar colegas que tenham passado por situação semelhante à minha. Espero que ajude a alguém que se encontra na mesma situação que eu: no início da carreira docente. Muitas vezes não encontramos essas dicas nos livros acadêmicos ou nas aulas de Didática na graduação.
Isso tudo só constata que mesmo com tantos aparatos tecnológicos no universo educacional o quadro ainda pode ser o nosso melhor amigo.
Sem dúvida, em algum momento da nossa prática docente já nos perguntamos o que poderíamos fazer para tentar instigar mais nossas turmas a se interessarem ou mesmo gostarem das nossas aulas e conteúdos. Porém, cabe unicamente a nós professores e professoras a responsabilidade de estimular os e as estudantes a demonstrarem mais interesse sobre nossa componente curricular?
Antes de iniciar minha trajetória como professor e ainda no início dela eu chegava a acreditar que eu era diretamente responsável pela demonstração de interesse dos alunos e das alunas nas aulas que ministrasse. Já que eu era a pessoa que iria construir conhecimento através dos conteúdos organizados no currículo da minha componente devia sim ser eu o principal responsável por instigar a turma nas aulas. E se esse interesse não fosse devidamente demonstrado a culpa deveria recair sobre mim, consequentemente. Ledo engano...
Aos poucos passei a me dar conta de que existem muitos outros fatores que fugiam ao meu controle no momento de ministrar a aula, desde a estrutura da escola até a vida pessoal de cada aluno e aluna. Mesmo que eu preparasse e ministrasse a melhor aula do mundo e da minha vida isso não iria garantir que as pessoas ali da minha turma demonstrassem o interesse condizente com a minha prática pedagógica naquele momento.
Isso foi e é importante para compreender que não: não temos a obrigação de estimular ninguém a se interessar sobre nossos conteúdos. Primeiro que em nossa formação não cursamos a componente de "Como fazer a sua turma se interessar em sua aula". Segundo que esses outros fatores alheios à aula em si muitas vezes são determinantes para permitir o interesse do aluno ou aluna no conteúdo.
Muitas vezes essas pessoas acordam de 4h da manhã para assistir aulas às 7h sem nem ter comido algo. E também foram dormir de meia-noite fazendo um trabalho para acordar nesse horário. Outras vezes aconteceu algum problema na família que abalou emocionalmente a aluna ou aluno. O ar condicionado da sala não está funcionando e todo mundo está morrendo de calor (inclusive o professor que vos fala). São tantos os fatores que fogem ao nosso controle quando estamos ministrando a aula...
Portanto, eu não tenho mais essa percepção (inocente) que preciso a todo custo fazer com que a turma esteja em todas as aulas interessada nos conteúdos ministrados. Vão haver momentos que a pessoa A pode estar mais instigada e a pessoa B não. Podem haver aulas que aconteça o contrário. Podem haver aulas que ninguém esteja interessado e estejam contando os minutos para acabar o horário. E assim por diante.
Ter essa compreensão me ajudou a tirar um pouco o peso das costas que carregava em achar que se toda a turma não estivesse 100% interessada nas minhas aulas eu estava fracassando como educador. Isso não quer dizer que eu não deva me empenhar em preparar e ministrar uma aula interessante e que cumpra efetivamente o papel do processo de ensino-aprendizagem. Porém, não preciso achar que tenho que carregar sozinho o peso de instigar as pessoas a se interessarem pelos conteúdos da minha componente curricular.